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Investimento público em educação ajudou a reduzir desigualdade de renda no Brasil, mostra estudo

Levantamento aponta que investimentos em educação entre 2001 e 2015 ajudaram a distribuir renda no Brasil, mas queda dos gastos nos últimos anos acende alerta para aumento da desigualdade

por Comunicação da Campanha Nacional pelo Direito à Educação

O aumento de investimento na educação pública, com foco na educação básica, teve efeitos redistributivos na renda da sociedade brasileira entre 2001 e 2015 – ou seja, reduziu-se a desigualdade de renda. Nos últimos cinco anos, porém, com políticas de austeridade que reduzem gastos públicos em educação, deve haver aumento das desigualdades – não somente educacionais, mas também de renda.

É o que mostra estudo produzido pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação,  Centro de Defesa da Criança e do Adolescente do Ceará (CEDECA Ceará) e Cede-UFF (Centro de Estudos sobre Desigualdade e Desenvolvimento da Universidade Federal Fluminense), em parceria com a CLADE (Campanha Latino-Americana pelo Direito à Educação) e a Oxfam Brasil.

O estudo foi lançado nesta segunda-feira (19), em live da Campanha Nacional pelo Direito à Educação com a participação das entidades. O link para o documento será disponibilizado nesse horário.

ATUALIZAÇÃO: ACESSE O ESTUDO NA ÍNTEGRA AQUI.

Analisando o período 2001-2015, o estudo compara indicadores das distribuições de renda original com aqueles decorrentes do investimento em educação.

No período 2001 a 2005, a progressividade do investimento em educação pública cresceu e se estabilizou, enquanto a contribuição da educação à renda ficou estável. No período 2005-2015, a progressividade manteve-se em patamar alto, enquanto cresceu a contribuição da educação à renda.

O esforço do governo federal com educação refletiu-se nos diversos níveis de ensino, mas com intensidade três vezes maior na educação básica do que no ensino superior. Em valores correntes (dos respectivos anos), o investimento por estudante na educação básica passou de R$ 899 em 2000 para R$ 7.273 em 2015, enquanto o da educação superior sobe de R$ 8.849 para R$23.215.

Em 2001, o investimento por estudante em educação superior era mais de 10 vezes (10,47) superior do que o mesmo valor destinado para cada estudante da educação básica. Em 2015, essa diferença caiu para cerca de 3 vezes (3,64).

De 2015 para cá, no entanto, o investimento público em educação foi reduzido. Se persistirem as políticas de austeridade e cortes de gastos na política educacional, haverá aumento da desigualdade de renda, afirma o estudo.

Recursos destinados ao Ministério da Educação (MEC) apresentaram declínio de 8,8% nos últimos cinco anos, o que representa uma redução correspondente ao valor de R$ 10,6 bilhões, de acordo com dados do SIGA Brasil.

Mais educação pública, mais distribuição de renda
Para uma melhor avaliação dos efeitos redistributivos da educação, o estudo fez uma decomposição do índice de Gini (medida sintética da desigualdade da renda domiciliar per capita que varia entre 0 a 1, sendo que quanto mais perto de 1, maior é a desigualdade). Com isso, conseguiu constatar que o efeito redistributivo da educação extrapola os ganhos da própria educação.

“O investimento em educação é importante por razões diretamente associadas ao valor individual e coletivo da educação. O investimento público em educação equaliza oportunidades ao oferecer um serviço gratuito, desmercantilizado”, diz o estudo. “Seu efeito redistributivo é considerável. Claramente, é um investimento muito bom em termos de eficiência e equidade, e com potencial para o ser ainda mais, tendo em vista que o valor por aluno ainda é muito baixo”.

 

A distribuição de renda brasileira no período não apenas ficou menos desigual, como também o investimento em educação se tornou mais progressivo, ao beneficiar ainda mais intensamente as camadas menos abastadas da população em 2015 que em 2001.

“Os 40% mais pobres foram sempre os mais beneficiados pelo investimento público em educação, e seu quinhão de investimento em educação básica aumentou entre 2001 e 2015”, diz o estudo.

O estudo considera uma série de políticas públicas como chave para o efeito redistributivo positivo: evolução do Fundef ao Fundeb e do Bolsa Escola ao Bolsa Família, valorização do salário mínimo, expansão do período de educação básica obrigatória para 12 anos, piso nacional salarial para professores e políticas variadas em prol da expansão da educação básica e superior.

O Brasil do começo dos anos 2000 tinha indicadores sociais e de educação distantes do ideal: de um lado, desigualdade, pobreza, desemprego e informalidade elevados, de outro, altas taxas de analfabetismo e atraso escolar, baixa frequência à escola, à exceção da faixa 7-14 anos.

Em meados da primeira década, como fruto da conjuntura econômica internacional favorável e de um amplo leque de políticas públicas, observaram-se melhorias em indicadores sociais e educacionais.

Para viabilizar as políticas, o investimento público social (gastos diretos e tributários) elevou-se, como proporção do PIB, de cerca de 13% em 2002 para 18% em 2015 . O investimento federal com assistência social elevou-se em um ponto percentual do PIB, mesma ordem de grandeza observada para educação e cultura.

Teto de gastos e PNE
O estudo também afirma que, seguindo-se as políticas de austeridade e cortes de gastos na política educacional, haverá aumento da desigualdade de renda “em seu conceito ampliado (que atribui valor ao investimento em educação)”, conforme mostram simulações do índice de Gini.

Se houve avanços com relação à educação e à renda, inúmeros problemas persistem e se agravam.

Na contramão do que seria desejável, em 2016, o governo aprovou a Emenda Constitucional 95 (Teto de Gastos) para congelar o orçamento da educação para os próximos 20 anos.

O estudo mostra que é preciso urgentemente suspender a Emenda Constitucional 95 para haver investimento adequado nas áreas sociais e superar desigualdades.

“Fica evidente o aumento linear da desigualdade caso sejam reduzidos os investimentos, podendo-se afirmar que aumentos reais no valor do
investimento incrementam os impactos redistributivos”, diz o estudo.

 

A EC 95 é definida pela ONU como a medida econômica mais drástica contra direitos sociais do planeta. Atualmente, duas propostas de emenda revogatória da EC 95 tramitam no Congresso Nacional: a PEC 54/2019 e a PEC 36/2020.

Tramitam no Supremo Tribunal Federal ações diretas de inconstitucionalidade pela derrubada da EC 95. A Campanha e entidades integrantes da Coalizão Direitos Valem Mais contribuem como amicus curiae (amigos da corte) nas ações.

Essa medida não só asfixia as 20 metas e centenas de estratégias previstas no Plano Nacional de Educação 2014-2024, que previam universalização da educação básica, aumento do acesso à educação superior e melhorias significativas em termos de qualidade, como poderá impactar no próximo plano, que estaria previsto para o período entre 2024 e 2034.

Segundo balanço realizado pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação, em 2020, no sexto ano de vigência do PNE, somente quatro metas apresentam algum avanço – ainda que parcialmente cumpridas – e todas as demais estão descumpridas e estagnadas.

A execução orçamentária no período 2014-2018 apresentou visível declínio, tanto no que se refere ao Ministério da Educação, bem como para a Função Educação e as respectivas Subfunções. No ano de 2019, cortes, políticas de contingenciamento e orçamento não executado dificultaram a execução dos investimentos em educação.

A aprovação, em 2020, do novo e permanente Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação) deverá colaborar para:

1) amenizar os impactos das políticas de desfinanciamento, já que prevê um aumento do financiamento para a área (passando de 10% para 23% de complementação da União);

2) gerar um sistema mais equitativo de distribuição de recursos, sem desestruturar as redes de ensino;

3) a garantia de qualidade por meio da constitucionalização do Custo Aluno-Qualidade (CAQ);

4) a vinculação do financiamento com agendas de avaliação da política educacional, por meio da constitucionalização do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Sinaeb);

5) a destinação dos 70% dos recursos do Fundeb para a valorização de todos os profissionais da educação;

6) a proibição do desvio dos recursos de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino para o pagamento de aposentadorias;

7) a garantia do uso do recurso público exclusivamente para a educação pública. Todos esses pontos foram propostas e agendas de luta da Campanha Nacional pelo Direito à Educação e de sua rede.

Austeridade e esforço regional
Com base em descrição da Plataforma DHESCA (Plataforma de Direitos Humanos Dhesca Brasil), políticas de austeridade econômica, via de regra, “envolvem o corte de despesas que são consideradas essenciais para a população, com vistas a reduzir gastos públicos em áreas como saúde, educação e moradia, além da diminuição de postos de trabalho. Ou seja: uma austeridade apenas para os pobres, não para os ricos, protegida por um discurso falacioso do sacrifício que esconde a realidade de grande sofrimento gerada na vida de crianças, jovens e adultos”.

O estudo integra um esforço regional mais amplo da CLADE, Oxfam IBIS e IIPE UNESCO-Buenos Aires, de reflexão sobre as relações entre educação e desigualdades na América Latina e Caribe. Haverá também um estudo sobre o contexto latino-americano em breve, com casos que destacam diferentes aspectos sobre educação e desigualdade no Brasil, Bolívia, Colômbia, Guatemala, México e República Dominicana.

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Fortaleza é a segunda capital no Nordeste com menos investimento em assistência social a crianças e adolescentes

Criança e adolescente têm prioridade absoluta, e isso precisa estar expresso no orçamento público. O que deveria acontecer na prática, porém, está muito longe da realidade de meninos e meninas de Fortaleza. A capital do Ceará é a segunda do Nordeste que menos destinou investimentos para essa população em 2017, comparando-se o segmento de assistência social. Fortaleza destinou R$1,60 para cada criança e adolescente em 2017. Valor per capita só inferior a Teresina, que investiu R$0,79. Salvador, no topo do ranking, executou R$37,54 para cada criança e adolescente no mesmo período. Fortaleza tem uma população de aproximadamente 628 mil crianças e adolescentes (até 17 anos) e investiu pouco mais de R$1,03 milhão em assistência social para essa população em 2017.

Os dados foram elaborados pelo CEDECA Ceará a partir do cruzamento de informações da execução da subfunção “Assistência à Criança e ao Adolescente”, vinculada à função “Assistência Social”, do orçamento das capitais brasileiras reunidas pela Secretaria do Tesouro Nacional (STN), com informações da pesquisa PNAD Contínua, do IBGE, que calcula a população de 0 a 17 anos das cidades. Todos os valores estão para consulta pública no site das duas instituições.

 

Confira os dados em detalhes

 

 

Quando se compara Fortaleza com todas as capitais do País, o cenário é ainda mais preocupante. Na análise dos dados das 26 capitais de Estado, Fortaleza é a quarta do País que menos investiu em assistência a crianças e adolescentes, segmento do orçamento que engloba ações de prevenção e combate a violações de direitos humanos, como situação de rua e violência sexual.

 

 

Consequências da falta de investimento
O orçamento público é instrumento fundamental para o enfrentamento das desigualdades que marcam as sociedades. A depender do modo como é planejado, pode contribuir para diminuir as disparidades sociais e violações de direitos ou pode agravar essas diferenças. O orçamento expressa, portanto, uma opção política do poder público em escolher as prioridades para cada ano da gestão municipal, estadual ou federal.

E não é por falta de arrecadação que o Município não tem investido no segmento de assistência social de crianças e adolescentes. Fortaleza é a quarta capital nordestina em arrecadação per capita: R$ 2.443,57 por habitante em 2017.

Além disso, em números reais, a arrecadação municipal apresentou crescimento médio anual, de 2013 a 2017, de 2,52% e, no período de 2013 – 2017, evidenciou crescimento de 10,06%. A gestão municipal priorizou os gastos com publicidade governamental, que totalizaram cerca de R$ 32 milhões em 2017. Outra despesa específica chama a atenção: a Prefeitura previu, apenas com gastos de aluguel do gabinete do vice-prefeito, R$792 mil em três anos (2017-2019) ou R$22 mil mensais.

A cidade que destina poucos investimentos de assistência social a crianças e adolescentes é a mesma em que, somente em 2017, 414 adolescentes foram vítimas de homicídio. Negligência e desrespeito à garantia de vida digna para crianças e adolescentes expressas na falta de prioridade dada a essa população.

Histórico de inversão de prioridade
Não é de hoje que os números do orçamento de Fortaleza no segmento assistência social a meninos e meninas preocupam. Em 2017, o montante de recursos foi o menor dos últimos 15 anos. O volume total de investimentos na subfunção assistência à criança e ao adolescente vem caindo desde 2013. De 2014 a 2017, o município não executou nem um real no atendimento psicossocial a crianças vítimas de violência sexual. Além disso, o programa Ponte de Encontro, de atendimento a crianças e adolescentes em situação de rua, gastou apenas R$8 mil (0,92% do saldo atual) em 2017.

O CEDECA Ceará vem, juntamente com organizações que integram o Fórum DCA, denunciando como o cenário de baixo investimento impacta no combate à exploração sexual de crianças e adolescentes; na erradicação do trabalho infantil; na execução de políticas públicas de atendimento psicossocial a crianças e adolescentes vítimas de violência sexual; nos serviços de abordagem social nas ruas; na prevenção e enfrentamento de homicídios na adolescência e à extrema pobreza.

Desde 2015, organizações e movimentos reunidos no Fórum DCA – Ceará apontam como a Prefeitura é violadora de direitos, especialmente nas áreas de atendimento a vítimas de violência sexual e população de rua. A mobilização resultou em duas Ações Civis Públicas que têm como base as denúncias e análises realizadas pela sociedade civil por meio do Fórum DCA – Ceará.

“A falta de prioridade representa a negligência do poder público municipal com a situação peculiar de desenvolvimento de crianças e adolescentes e o desrespeito ao preceito constitucional de prioridade absoluta, ao desconsiderar que pobreza e violência são condições que se entrecruzam e permeiam o cotidiano de crianças e adolescentes”, aponta Renam Magalhães, técnico do CEDECA Ceará responsável pelo monitoramento de orçamento público.

Saiba Mais
O orçamento público é instrumento fundamental para o enfrentamento das desigualdades que marcam as sociedades. A depender do modo como é planejado, pode contribuir para diminuir as disparidades sociais e violações de direitos ou pode agravar as diferenças sociais. O orçamento expressa, portanto, uma opção política do poder público em escolher as prioridades de uma gestão.

Notas metodológicas
1 O investimento per capita, que permite comparar os orçamentos das capitais, é a divisão dos valores executados do orçamento pelo total da população de crianças e adolescentes da respectiva cidade;
2 O que são “função” e “subfunção” do orçamento? Uma das maneiras que o orçamento público se classifica é por meio de Funções. Estas são as áreas que receberão os investimentos, como educação, saúde, assistência social, etc. Além disso, essas áreas podem se dividir em outras menores, que são as subfunções, como, no caso da assistência social, assistência a crianças e adolescentes.
3 Valores reais são aqueles que consideram os efeitos da inflação. Já os valores nominais não o consideram. Ao se comparar valores ao longo de vários anos, levamos em consideração os efeitos inflacionários, uma vez que o preço de um bem na data de hoje não é o mesmo do ano passado.
4  As despesas intraorçamentárias são aquelas que ocorrem entre os órgãos da mesma esfera de governo. Tais despesas são separadas das despesas orçamentárias para se evitar dupla contagem. Logo, a metodologia que desconsidera as despesas intraorçamentárias aproxima-se mais do que foi gasto efetivamente.

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