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O CEDECA Ceará e a manutenção de suas atribuições institucionais em tempos da COVID 19

O CEDECA Ceará é uma instituição que atua há 26 anos na defesa dos direitos de crianças e adolescentes, com fundamentos no que estabelecem a Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança (1989), a Constituição Federal do Brasil (1988), o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (1990) e a Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN (1996). A missão da organização é a defesa intransigente dos direitos de crianças e adolescentes, especialmente quando estes são violados pela ação ou omissão do Poder Público.

A experiência do CEDECA Ceará na defesa do direito à educação pública, gratuita e de qualidade remonta aos primeiros anos de existência da instituição1 e, desde 2001, em articulação com a Campanha Nacional pelo Direito à Educação2. Em diversos momentos, lutamos pela valorização dos/das profissionais da educação, porque compreendemos que o direito à educação é efetivado em sua plenitude com a garantia dos direitos dos estudantes e com as condições dignas para trabalhadores e trabalhadoras.

Em 2020, a sociedade brasileira vivencia os efeitos drásticos da pandemia da COVID-19, que têm atingindo de maneira desigual a parcela mais vulnerabilizada da nossa população. Tais efeitos se manifestam também entre estudantes e profissionais da educação neste momento da suspensão das aulas presenciais, medida extremamente necessária para a priorização do direito à vida e da saúde das pessoas.

Em verdade, sabe-se que o “ensino não presencial” requer uma complexidade de adaptações: de planejamento, de recursos técnicos e tecnológicos, de acompanhamento adequado, de formação profissional e de condições de trabalho adequadas, dentre outros. Sabemos também que os professores das redes públicas possuem pouca familiaridade e não tiveram formação adequada para trabalhar nesse formato de ensino, e que muitas escolas públicas sequer possuem infraestrutura adequada para tal.

Com o intuito de contribuir no equacionamento de soluções para esta situação de excepcionalidade o CEDECA Ceará e a Campanha Nacional pelo Direito à Educação, junto com outras entidades da sociedade civil, produziram materiais cujos propósitos têm sido dialogar com as comunidades escolares, estudantes, famílias e profissionais da educação e com os tomadores de decisão do poder público. São exemplos dessas publicações, os Guias 1 e 2 COVID-19: “Educação e Proteção de crianças e adolescentes”3 e o Guia 3 COVID-19: Educação a Distância4, ambos lançados no mês de abril deste ano.

Ainda em abril, o CEDECA Ceará enviou recomendações à Proposta de Parecer do Conselho Nacional de Educação (CNE) sobre reorganização dos calendários escolares durante o período de pandemia5, junto com outras 22 contribuições enviadas por membros da Rede da Campanha Nacional pelo Direito à Educação6.

De maneira breve, o documento apontou:

Que o “ensino remoto” pode ocasionar o agravamento das desigualdades sociais, provocando uma situação de discriminação no campo do ensino para estudantes que não possuem condições de acessibilidade às tecnologias da informação e de comunicação, ou ainda condições socioeconômicas e psicológicas de acompanhar as atividades nesse período. Portanto, deve ser garantido o cumprimento do princípio da igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;

– Nesse sentido, recomendou-se que haja a flexibilização do calendário escolar, de maneira tal que as atividades escolares desenvolvidas durante o período de isolamento social tenham caráter educativo, complementar, interativo e de apoio aos estudantes e às suas famílias, aos professores e à comunidade escolar. Dessa forma, essas atividades não devem ser contabilizadas para fins de cumprimento da carga horária obrigatória;

– Que no processo de ensino e aprendizado seja assegurado o princípio da garantia de padrões de qualidade na educação pública;

– Que seja garantido o direito à alimentação escolar de qualidade, através da distribuição de alimentos para todas as crianças e adolescentes das redes de ensino. Que os kits, preferencialmente, sejam compostos por alimentos frescos e minimamente processados, buscando manter o suprimento semanal de porções de frutas, verduras, tubérculos e raízes. Que a aquisição de alimentos da agricultura familiar deve ser priorizada e mantida;

– Que é necessário valorizar o pilar do ensino, com os/as professores como sujeitos, para que eles/elas possam ter uma sólida formação cultural e pedagógica e ser o motor central da socialização, da criação de ambientes educativos compartilhados e cooperativos. Nesse sentido, é obrigatório garantir estabilidade no trabalho, salários e segurança para esses profissionais.

Por fim, destacamos que o controle social/monitoramento das políticas educacionais e a defesa dos direitos são formas legítimas de participação da sociedade civil nas definições das políticas públicas e sabemos da relevância das articulações entre as comunidades escolares, as organizações da sociedade civil, os poderes públicos e demais atores institucionais, cuja interação pode possibilitar a promoção de políticas públicas inclusivas e democráticas.

CEDECA Ceará

Fortaleza, 2 de junho de 2020.

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Redução não é solução! Entenda por que em 5 respostas rápidas

Por que muitas pessoas são a favor da redução da maioridade penal?

Quando um adolescente comete um ato infracional, falharam a comunidade, a sociedade e o poder público na prevenção dessa violência. Muitas pessoas colocam a redução da maioridade penal como se fosse a medida mais urgente de segurança pública por desconhecimento do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e das diversas causas da violência no Brasil.

É fato que a violência vem aumentando de modo geral no País. Isso coloca as pessoas numa posição de medo e de direcionar essa culpa para adolescentes.

Além disso, uma mentira difundida é que adolescentes não são responsabilizados por seus atos à margem da lei. É preciso lembrar que, no Brasil há responsabilização de adolescentes a partir dos 12 anos de idade. Há 20.745 adolescentes privados de liberdade em todo o País, segundo levantamento mais recente do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase). Desde a aprovação do ECA, em 1990, setores conservadores vêm trabalhando para disseminar a ideia errada de que o Estatuto é uma lei que “acoberta adolescentes”. Isso é falso.

Quais as consequências de uma possível mudança na lei?

O encarceramento em massa de adolescentes negros e da periferia. O Brasil é o país com a quarta maior população carcerária mundialmente.

Esses sujeitos estão mais suscetíveis a todo tipo de violências no sistema prisional e se torna mais difícil o dever, que é de todos, de tirá-los do circuito do crime. Aprisionar mais a juventude é deixá-la mais vulnerável a organizações criminosas, por exemplo.

O encarceramento no Brasil, tanto de adolescentes como de adultos, tem crescido nos últimos anos. No entanto, a violência não tem diminuído. Algo está errado na lógica de repressão e responsabilização.

A sociedade que quer colocar na prisão uma pessoa de 16 anos tira dela a possibilidade de recomeço e impõe uma responsabilização desproporcional a quem ainda vai começar uma vida adulta.

Reduzir a maioridade vai contra os princípios do ECA?

Sim. Não é certo colocar adolescentes e adultos juntos no mesmo sistema prisional. Quase todos os países do mundo com legislação séria tratam de forma diferenciada adolescentes de adultos. A proposta de redução da maioridade penal altera essa perspectiva. O ECA já prevê seis tipos de medidas socioeducativas que dão conta de responsabilizar adolescentes em casos de violência (advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, semiliberdade e internação).

O tratamento diferenciado dado a adolescentes, da forma que existe hoje, não existe “porque ele não sabe o que estão fazendo”, como algumas pessoas dizem, mas sim por causa da condição peculiar de desenvolvimento que um adolescente se encontra. A sociedade que quer colocar na prisão uma pessoa de 16 anos tira dela a possibilidade de recomeço e impõe uma responsabilização desproporcional a quem ainda vai começar uma vida adulta.

O que é possível fazer, então, para conversar com as pessoas sobre isso?

A juventude não é a que mais mata, mas sim a população que mais morre. Somente em Fortaleza, o número de adolescentes mortos passou de 271 para 414 entre 2016 e 2017, ou seja, um salto de 91%, quase o dobro do número de mortos de um ano para o outro. Este é um quadro que deveria indignar a toda sociedade e não o clamor por uma medida que não vai resolver o problema desses adolescentes que morrem ano após ano. Ao tempo que os homicídios de adolescentes aumentam, os investimentos sociais com a infância e adolescência só diminuem. Nunca se investiu tão pouco. Tomando Fortaleza mais uma vez como exemplo, o investimento em 2017 é menor do que o investido em 2003. É preciso mudar a lógica dos governantes. Precisamos investir em direitos sociais e prevenção. A sociedade tem o dever de cobrar isso do Estado. Além disso, é preciso haver mais debate público sobre o tema. O que as pessoas querem de quem cometem atos de violência? Um castigo ou que elas mudem sua conduta?

 

A juventude não é a que mais mata, mas sim a população que mais morre. Este é um quadro que deveria indignar a toda sociedade e não o clamor por uma medida que não vai resolver o problema desses adolescentes que morrem ano após ano

 

O que é necessário para proteger os adolescentes e ampliar a garantia de direitos?

Fortaleza é a segunda capital do Nordeste com menos investimento em assistência social a crianças e adolescentes. É também a capital que mais mata adolescentes. Isso não é coincidência.

Para haver paz é preciso que haja justiça social, direitos para todos e todas e menos desigualdade. É preciso explicar a todos que prender mais gente não diminui a violência nem melhora nossa sociedade. Precisamos de outro modelo de segurança pública, com mais investimento em inteligência do que em polícia ostensiva.

No âmbito de outras políticas públicas, é preciso investir mais em ações de prevenção, oferecendo saúde, cultura, esporte e lazer a adolescentes e jovens negros e da periferia, principais vítimas dos homicídios nas cidades brasileiras.

O sistema de segurança deve priorizar a vida de crianças, adolescentes e jovens. É preciso colocar as pessoas no centro da política, aumentar os investimentos em assistência social, estruturar melhor as equipes de atendimento. 

Uma versão resumida dessas respostas foi publicada na edição de 23/01/19 do jornal Diário do Nordeste: http://bit.ly/NaoReducao

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