Oferecer uma resposta contra a impunidade dos fatos da Chacina do Curió é uma obrigação do Estado e da sociedade cearense

Nota de posicionamento do CEDECA Ceará sobre a 5ª sessão do júri da Chacina do Curió

Na próxima segunda (22/09) começa o quinto júri sobre o caso conhecido como Chacina do Curió. Dessa vez, serão julgados mais dois policiais militares pelos crimes de 11 homicídios consumados, três tentativas de homicídio, três torturas físicas e uma tortura psicológica.


Esta 5ª sessão do Tribunal do Júri Popular tem relevância especial por colocar luz em acontecimentos anteriores à Chacina e por expor o contexto que favoreceu a violência no território da Grande Messejana à época dos fatos. Trata-se de um momento crucial de compreensão por parte de toda sociedade cearense sobre a cadeia de responsabilidade pelos crimes cometidos antes e durante a Chacina.


De acordo com o Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE), um dos policiais réus que vai a júri no dia 22 de setembro, foi apontado como autor de um homicídio (vítima conhecida como Neném) e uma tentativa de homicídio no dia 25 de outubro de 2015, no mesmo território da Chacina. Quatro dias depois, o pai da vítima do dia 25 também foi assassinado horas após familiares do réu serem expulsos sob escolta da comunidade. De acordo com laudo pericial produzido pelo Departamento de Polícia Federal, o cano da arma utilizada para a morte do pai de “Neném” é o mesmo empregado contra uma das vítimas da Chacina do Curió.


No dia 11 de novembro, horas antes da Chacina, ocorreu um outro evento: a morte do policial militar Valterberg Chaves Serpa. Após essa sucessão de episódios violentos, instaurou-se um clima de medo na região, “com a presença de vários policiais à paisana, usando balaclava, aterrorizando e agredindo diversos moradores do bairro Curió”, segundo trecho da denúncia do MPCE.


Em junho de 2023, o conselho de sentença considerou culpados quatro dos réus elencados no mesmo processo que será julgado agora em setembro. No total, em quatro júris, foram seis agentes de segurança condenados. Ou seja, a sociedade, por meio do tribunal do Júri, reconheceu de modo evidente a participação nos crimes da Chacina de agentes de segurança cujo dever é proteger e preservar vidas. Oferecer uma resposta para mães, familiares e vítimas sobreviventes da Chacina contra a impunidade dos fatos é uma obrigação não só das instituições do Estado, mas de toda a sociedade cearense, que segue mobilizada.


Infelizmente, a Chacina do Curió não foi um caso isolado em Fortaleza. É preciso voltar um pouco no tempo, especificamente para 1993, e lembrar o caso conhecido como “Chacina do Pantanal”, marco importante quando falamos de violência policial contra crianças e adolescentes. Naquele ano, o assassinato de três adolescentes foi um marco na história da violência institucional no Estado. Ou seja, há mais de 30 anos a cidade registra casos de mortes simultâneas contra crianças e adolescentes por forças policiais do Estado.


Levar a julgamento agentes de segurança pública apontados como responsáveis pela morte de jovens periféricos representa, em si, uma vitória civilizatória importante da sociedade cearense, em um contexto ainda violento e de pouca responsabilização. É preciso avançar, porém, de modo a esclarecer os fatos e autores das 11 mortes violentas, além dos crimes registrados contra sete vítimas sobreviventes daquela madrugada que jamais serão esquecidas.


O CEDECA Ceará fortalece há mais de dez anos a luta do Movimento de Mães e Familiares do Curió. Para nós, da sociedade civil, é muito significativo que mulheres periféricas consigam se reunir, se organizar a partir de uma luta tão importante e se apresentem como um sujeito coletivo capaz de movimentar o Sistema de Justiça e as estruturas do Estado. As vozes dessas mulheres se encontram nessa luta e reverberam por todo o País. O choro, a fala, o grito por justiça das Mães do Curió também significam, para tantas outras famílias, um recado importante para que outras vítimas não se calem diante da violência do Estado.

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