Rede de atendimento à vítimas de violência sexual desestruturada e sem priorização orçamentária nas vésperas da Copa

A Copa do Mundo mais cara da história (só a construção e reforma de estádios já ultrapassa a marca de 8,5 bilhões, de acordo com o Tribunal da Contas da União) pode também deixar a marca de mais violadora de direitos humanos de crianças e adolescentes: destinação dos recursos públicos para obras previstas na Matriz de Responsabilidade acordada com a FIFA em detrimento da destinação dos recursos para políticas de atenção básica como moradia, saúde e educação, redução dos dias letivos para adequação ao calendário da Copa, violência policial, prisões e apreensões arbitrárias nos processos de mobilização massiva de manifestações contra a realização do megaevento no Brasil, estruturação de redes de exploração sexual de crianças e adolescentes e de tráfico de pessoas, dentre outras tantas violações.

Nesse contexto, crianças e adolescentes são a parcela mais impactada: nos processos de remoção forçada são os sujeitos mais afetados, pelo vínculo estabelecido com a comunidade e a escola (no Ceará, serão cerca de 4000 famílias entre removidos e ameaçados de remoção, de acordo com levantamento do Comitê Popular da Copa); a violência policial, com uma intensificação da criminalização da juventude pobre através da estigmatização dos jovens acusados de atos infracionais pelo aumento no número de internações e o aumento do número de vítimas de exploração sexual, uma das mais preocupantes violações e intensificada no contexto de realização de um megaevento esportivo.

Segundo lugar na rota de turismo sexual no Brasil (atrás somente do Rio de Janeiro), de acordo com dados do relatório da CPI da Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes da Câmara Federal, o Ceará enfrenta um quadro de significativo retrocesso nas políticas de enfrentamento a violência sexual contra crianças e adolescentes. Buscando traçar um diagnóstico das políticas ofertadas diante do contexto de realização da Copa do Mundo, o Centro de Defesa da Criança e do Adolescente do Ceará (CEDECA) realizou um monitoramento da política de enfrentamento à violência sexual em Fortaleza, constatando um cenário de inúmeras violações.

O Ceará atualmente não possui um Plano de Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes, o que repercute diretamente na orientação das políticas, destinação de recursos públicos e implementação dos serviços de forma eficiente. Em 2010 a Fundação da Criança e da Família Cidadã (FUNCI) destinou R$255.823 para a Rede Aquarela, programa de referência da Prefeitura no tema, chegando a executar 94,74% deste montante. Em 2013, ano que antecede a realização da Copa, o recurso destinado para o programa foi de R$911.290, no entanto, apenas 4,19% foi executado.

Além da pífia execução municipal em 2013, atualmente no Ceará não existe qualquer orçamento previsto para capacitação de profissionais para o enfrentamento da exploração sexual contra crianças e adolescente no âmbito do turismo e para o reaparelhamento e modernização da Delegacia da Criança e do Adolescente (DCA) e Delegacia de Combate à Exploração de Crianças e Adolescentes (DCECA).

Às vésperas da Copa do Mundo da FIFA, o crime de exploração sexual é negligenciado pelo poder público. Denúncias de exploração sexual só chegam à DECECA (única delegacia especializada em funcionamento no Ceará atualmente) através de demanda espontânea presencialmente ou através dos canais de denúncia (disques denúncia, Conselho Tutelar, entre outros). Nas noites e fins de semana o atendimento em regime de plantão é realizado na também sobrecarregada Delegacia da Mulher – DDM e não há plantões nos feriados.

Em Fortaleza não há nenhum serviço especializado de saúde para atendimento às vítimas de violência sexual. Para os casos que necessitam da realização de profilaxia de emergência dois hospitais disponibilizam o serviço: o Gonzaguinha de Messejana (profilaxia de gravidez) e o Hospital São José (profilaxia de DST). Caso a vítima necessite dos dois procedimentos, precisará se deslocar para os dois equipamentos.

O processo de monitoramento da política de enfrentamento à violência sexual em Fortaleza apontou uma rede de atendimento desestruturada e constantemente afetada por cortes orçamentários, em contrapartida, investimentos com a Copa do Mundo assumem um status prioritário dentro do orçamento do Estado. Para apresentar os dados coletados no monitoramento e dar visibilidade às violações, o CEDECA Ceará realizará uma coletiva de lançamento do documento, que apresenta o contexto das políticas e dos equipamentos de atendimento às vítimas de violência sexual e a análise orçamentária.

Mais informações:
Coletiva de imprensa e lançamento de nota técnica sobre a política de enfrentamento à violência sexual em Fortaleza
10 de junho, 15h
Centro de Defesa da Criança e do Adolescente do Ceará (CEDECA)
Rua Deputado João Lopes, 83 – Centro (Fortaleza, Ceará)

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