Nota do CEDECA Ceará sobre os assassinatos de crianças no Estado

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Os assassinatos de 04 (quatro) crianças no Ceará nas últimas semanas não são casos isolados. Infelizmente, sabemos que esse crime afeta diretamente meninos e meninas negras/os e moradores de periferia. Segundo o mapeamento realizado pelo Comitê Cearense de Prevenção e Combate à Violência, instituído pela Assembleia Legislativa do Estado Ceará, os homicídios contra a população de crianças e adolescentes ocorrem em sua maioria em áreas com pouco ou nenhum saneamento básico, equipamentos e serviços públicos.

Entre janeiro de 2019 e agosto de 2022, foram assassinadas 32 crianças de 0 a 11 anos no Estado. No mesmo período, 1.355 adolescentes de 12 a 18 anos foram mortos. Os dados são da Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS) do Ceará e mostram como a infância e juventude cearense estão na linha de tiro do crime organizado e dos agentes do Estado, sem que este tome medidas para garantir direitos fundamentais, dentre eles o principal: o direito à vida.

Quando uma bala encontra o corpo de uma criança como alvo – e no Brasil 66,3% delas negras[1], o Estado falhou em diversas vezes. E nós do CEDECA Ceará apontamos historicamente dois pontos:

1) Cortes no orçamento e a não priorização das políticas sociais, em destaque para as ações voltadas para a infância e adolescência, o que reflete no aumento de violações de direitos e no aumento da desigualdade social;

2) Uma política de segurança pública que foca no aumento da tropa, priorizando a ostensividade, mas não na construção de uma política de segurança pública integrada com o Sistema de Garantia de Direitos (SGD).

Em 2022, a Prefeitura de Fortaleza cortou R$ 10,4 milhões de reais da Assistência Social em comparação ao orçamento de 2021. Desse valor, R$ 7 milhões eram da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Desenvolvimento Social. No mesmo ano, o Município reduziu em 59% o valor previsto na Lei Orçamentária Anual que seria destinado a ampliar, reformar e manter a Rede Psicossocial. Destaca-se, ainda, o fato de Fortaleza não cumprir o Plano Municipal de Enfrentamento à Letalidade na Adolescência.

É evidenciado que há um alto investimento do Governo do Estado em um modelo de segurança pública que não tem funcionado. Se mantido o elevado investimento feito pelo Governo do Estado em segurança pública pelo viés como nos últimos anos, esse setor terá em 2024 orçamento maior que os da Saúde e Educação (comparados separadamente)[2].

Tem-se conhecimento que a escolaridade é comprovadamente um fator de proteção importante contra os homicídios e poderia contribuir para a redução desse tipo de mortalidade na infância e adolescência. De acordo com a pesquisa “Trajetória Escolar” do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), em Fortaleza 4.560 crianças e adolescentes abandonaram a escola[3]. Em 2020, o Estado do Ceará registrou 135.069 crianças e adolescentes entre 6 e 17 anos de idade fora da escola, de acordo com estudo do Unicef[4].

Os pontos acima mostram o descumprimento do que diz o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que defende a proteção integral e o princípio e regra da “prioridade absoluta” de crianças e adolescentes. Isso significa que essa população deve ter preferência na formulação e na destinação de políticas e serviços públicos, bem como a prioridade para a destinação do orçamento público.

Tudo isso evidencia que para o poder público a periferia não tem o mesmo valor social que outras áreas da cidade. O que resulta em mais violações de direitos, violência e mortes, como a dessas crianças e adolescentes.

Nós sabemos que a segurança e a efetivação da doutrina de proteção integral não virão desse modelo de política de segurança, pois  já está demonstrado que não reduz os homicídios de forma significativa. O caminho é a diminuição da desigualdade social, o investimento em educação, saúde, assistência social e políticas de enfrentamento ao racismo. O caminho é proteger nossas crianças e adolescentes garantindo acesso aos serviços, equipamentos e direitos assegurados na Constituição Federal.


[1] Disponível em: https://forumseguranca.org.br/wp-content/uploads/2022/07/12-anuario-2022-as-violencias-contra-criancas-e-adolescentes-no-brasil.pdf. Acesso em: 12/09/2022.

[2] Disponível em: < https://cedecaceara.org.br/wp-content/uploads/2020/12/Nota-Seguranca-Publica_2-edicao.pdf>. Acesso em: 12/09/2022.

[3] Disponível em: <https://diariodonordeste.verdesmares.com.br/ceara/interior-do-ceara-tem-mais-de-11-mil-criancas-e-adolescentes-fora-da-escola-diz-unicef-1.3262408>. Acesso em: 12/09/2022.

[4] Disponível em: <https://g1.globo.com/ce/ceara/noticia/2021/04/29/numero-de-criancas-e-adolescentes-fora-da-escola-aumentou-em-170percent-no-ceara-em-2020-de-acordo-com-unicef.ghtml>. Acesso em: 12/09/2022.

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